segunda-feira, 2 de abril de 2012

Tão longe, tão perto.


Passei várias das minhas longas tardes pensando nela. No modo como ela abria a bolsa, apressada, procurando por alguma coisa que ela nem sabia o que era. Reparando nos olhos, tentando entender de onde vinha aquele olhar tão independente... Nunca ousei falar com ela, acho que mais por medo do que por vergonha. No final das contas, aquele olhar... Ele me afastava dela. Tão longe, tão perto.
Tenho quase certeza que ela nunca me reparou sentado naquele banco do parque. Assim como tenho certeza que mesmo que tivesse me visto, não teria me enxergado. 
Até hoje me pergunto se deveria ter derramado um copo de suco no vestido dela, só pra ela me xingar.
Pelo menos teria me visto.
Desde que a venho reparado na praça, meus pensamentos sobre mim mesmo mudaram. Não me sinto mais tão vazio. E isso tudo é absurdamente estranho, por que ela não sabe nem ao menos que existo. Devo me atrever?
Tenho a inconsistência de nunca saber de nada, mas quando se trata dela, parece piorar...
Nem ao menos sei o seu nome.
Mas acho que isso alimenta o meu querer.
Ela tem rosto de Cecília, e alma de Manoela. Talvez nenhum desses... Talvez só Maria.
E eu? Eu apenas eu mesmo, apenas o cara do banco, que ela nunca se quer relançou o olhar. Ah... O olhar!
Ela chegou! Ela está aqui! Ela está na minha frente! Está vindo em minha direção!
Não.. Não pode ser.. Ela sentou-se ao meu lado.
O que faço? Não parei de escrever ainda, ela vai pensar que sou um nerd sem precedentes... Droga!
- Você nunca cansa de anotações?
Ele pensou: Ela está mesmo falando comigo? Meu coração está em pane. Fale.. Seu idiota, FALE!
(Gaguejando)
- E-Eu? Bo-boa tarde. Só.. Estou aqui, tentando escrever algo bom.
- Eu sempre o vejo aqui, sentado nessa mesma posição, com esses mesmos livros. E sempre rabiscando.
Ele pensou: Ela me viu? Só pode estar mentindo.
- Já me viu aqui antes?
- Se eu estou falando, é por que vi.
- Ah.. Desculpe, pensei que nunca havia reparado.. Eu que sempre a vejo por aqui, sempre muito apressada.
- É, a vida é rápida, e nos requer habilidades. Nem sempre tenho as que preciso, mas tento.
- Você é muito bonita. Se me permite lhe elogiar.
- Permitir eu não permito, mas já que o fez. Obrigada.
Ele pensou: Não posso acreditar que estou falando com ela.
Ele só sorriu.
- No que está pensando? Aliás, posso ver o que escreveu?
 - Estou pensando, que não deveria mais pensar em nada.
- Posso ler?
- Os meus rabiscos?
- É.
- Pode.
E ela leu. Fazia umas expressões de sarcasmo enquanto lia.
- Quem é essa vadia?
Ele se espantou, mas riu. 
- Você.
- Eu? 
Abriu a boca em tom de risada.
- É.. Mas, não quis dizer que era vadia..
- Hum.. É?
- Sim.
- Escreveu sobre mim mesmo?
Ele fez que sim com a cabeça.
Ela gargalhou.
- Você repara bem.
- Você também, mas pensei que não.
- Você anda pensando muito e fazendo nada. E a propósito meu nome é Lúcia.
- Seu nome... Eu.. Estou tentando não pensar em nada agora.
- Mas está.
- Adivinhe!
- ''Será que devo beija-la? Ou será que ela vai me bater?''
Ele corou e sorriu de lado.
-Errei?
- Mais ou menos...
- Então o que pensavas?
- Que você é estupidamente linda!
Ela abaixou a cabeça. Ele levantou-a com a mão direita.
- Seus olhos...
Ela levantou a sobrancelha esquerda.
- São.. São.. Tão.. Ameaçadores.
- Não tenha medo. São só pálpebras.
Ele contraiu a boca.
- Estou tentando.
- Não tente, não pense... Faça! A vida é curta demais pra apenas pensar sem agir.
- Você tem sempre pressa.. Mas é isso que te deixa linda.
Ela sorriu.
Ele a beijou devagar... Bem devagar.
Ela pensava que aquilo já deveria ter acontecido. Ela deveria ter sentado naquele banco antes, bem antes.
E ele só pensava que não queria mais pensar. Queria estar.


Nenhum comentário:

Postar um comentário